30 março, 2013

Expectativas Constitucionais Vs Realidade




Diariamente, a comunicação social recorda-nos que as medidas deste Governo violam a Constituição e não resolvem os problemas do País por serem recessivas (como se existisse algum caso de um País sob resgate que implementasse políticas expansionistas...).                                                      

O que nunca se vê explicado, naqueles programas que chegam a milhões de espectadores, é precisamente quais os impactos recessivos da decisão do Tribunal Constitucional (TC) em 2012, quando se pronunciou pela inconstitucionalidade dos cortes nos subsídios da função pública.      

Recorrendo a um exemplo, vamos tentar perceber qual o impacto da decisão do TC na economia portuguesa. Para simplificar o exemplo, considerem-se os seguintes pressupostos:

PIB = 100.000 milhões € (M€)

Cortes nos vencimentos, sobre os quais o TC se deve pronunciar, iguais a 5% do PIB.                  

Nesse ano, as receitas ascendem a 60.000 M€ e a despesa de 65.000 M€, i.e., o balanço de receitas e despesas do Estado é de - 5.000 M. O PIB quebra 2%.

Então, no final desse ano: (5.000/98.000) O défice do Estado foi de 5,1 %.           

Agora, o TC determina que metade daqueles vencimentos têm de ser repostos (2.500 M€, 2,5% do pib inicial no nosso exemplo). Isto significa que, no ano n+1, a despesa passará de 65000 para 67500. O balanço de receitas e despesas do Estado passará então para - 7.500 M€.                                                         

Ou seja, logo à partida, o défice passa para 7,7% (7.500/98.000)

Então para voltar aos 5% de défice (saldo de 4.900 M€ entre receitas e despesas), será necessário cortar na despesa ou arrecadar receita adicional (Impostos) no valor de 2.600 M. Se o objectivo for um défice de 4%, será necessário cortar 3.580 M€…

Isto foi o que sucedeu em Portugal no OE 2013 em virtude do chumbo de TC em 2012, relativamente ao corte dos subsídios da função pública. Como é impossível fazer aquela correcção totalmente do lado da despesa, torna-se necessário recorrer ao aumento (brutal…) de impostos sobre funcionários públicos e privados.

Na prática, a subida de impostos fará com que os funcionários públicos fiquem mais ou menos com o mesmo rendimento do ano anterior, no entanto, os do sector privado - que, por se situarem na “economia real”, para além dos ajustamentos salariais já sofridos desde 2008 e a realidade do desemprego (embora o TC não reconheça esta desigualdade entre público e privado) -, também passaram a ser afectados pela redução de rendimento, por via do aumento de impostos que a decisão do TC forçou.

Em suma, não é melhor para ninguém, mas assim já é Constitucional!

Os problemas que Portugal tem pela frente não são jurídicos, nem ideológicos - são de aritmética. E, por mais nobres que sejam (alguns) dos princípios inscritos na Constituição, se forem incompatíveis com a realidade, tratam-se de uma utopia. 

O défice devia ser reduzido, 2 terços de cortes na despesa e 1 terço de aumento da receita, mas a Constituição não permite... Nunca vi, num telejornal por exemplo, comentadores explicarem que o veto a medidas de corte na despesa do Estado, obrigará, este ou outro governo, a recorrer a medidas ainda mais recessivas – o aumento de impostos. 
A via (do saque…) fiscal, para além de retirar rendimento às pessoas, dificulta ainda mais a recuperação:
- das empresas: menos criação de emprego, logo, mais despesa com subsídios e menos receita da segurança social, e;

- dos cidadãos: menos rendimento leva a menos consumo, logo, menos receita fiscal para o Estado.

Em resumo, aumento de impostos – ao contrário do corte na despesa do Estado - tem um efeito duplamente nocivo para o objectivo de controlo do défice, i.e., para equilibrar as receitas e despesas do Estado. 
           

Expectativas Constitucionais Vs Realidade
Por exemplo, na Constituição encontramos coisas como: Art. 65º - “Todos têm direito, para si e para a sua família, a uma habitação de dimensão adequada, em condições de higiene e conforto e que preserve a intimidade pessoal e a privacidade familiar.”

Entre os inúmeros direitos que o “texto fundamental” garante aos cidadãos portugueses, este é um exemplo de uma “inconstitucionalidade” que a sociedade já interiorizou não ser compatível com a realidade e por isso já “não pega” recorrer ao TC para que o Estado lhe dê uma casinha.       

O mesmo sucederá (infelizmente) com muitas outras das garantias “oferecidas” pela CRP… porque deixaram de ser compatíveis com a realidade, ea sociedade portuguesa – a bem ou a mal - terá de conviver com isso.
Independentemente do partido no governo, nos próximos 15, 20 (30?) anos - período em que estaremos graças ao buraco e dívida que alguns cavaram - nas mãos dos credores, o único princípio constitucional a preservar pelos Srs. Juízes, deverá ser a efectiva protecção dos mais desfavorecidos. E esses são os desempregados (jovens e menos jovens) e os mais de 90% de pensionistas que vivem com menos de 1.000 € por mês. 
 
Infelizmente, a Constituição é fértil em DIREITOS, mas poupada em DEVERES, recordem-se algumas coisinhas "constitucionais" feitas nos anos mais recentes: criar 90.000 M€ de dívida pública que levará 50 anos a pagar; nacionalizar o BPN (que custará cerca de 7.000 M€); comprometer, no âmbito de contratos com PPPs, os contribuintes com 40.000 M€ de dívida indirecta; pagar cerca de 4.000 milhões de rendas excessivas à EDP através da nossa factura da electricidade...



Srs Jornalistas e portugueses em geral, estas medidas não resultam de uma vontade, ou opção, de Passos e Gaspar, não há dinheiro, nem nos voltam a emprestar.

Get over it!